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Renascimento: Maquiavel, Bacon, Descartes e Hobbes - 4-5/dez

Renascimento: Maquiavel, Bacon, Descartes e Hobbes

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O Renascimento e o Advento da Filosofia Moderna 
“O Nascimento de Vênus”, obra do pintor renascentista Sandro Botticelli (Reprodução) 
Nascimento de Venus
A Idade Moderna compreende o período entre a tomada de Constantinopla – então sede do Império Bizantino – pelo Império Turco Otomano, em 1453, e a Revolução Francesa, em 1789. 
Foi uma época de transição do feudalismo para o capitalismo industrial e, consequentemente, de uma sociedade nobiliárquica para uma sociedade burguesa. A Idade Moderna europeia foi moldada a partir de quatro fenômenos fundamentais: 
1 O Renascimento (séculos XIV-XVI), ato inaugural da modernidade, que instituiu uma visão renovada do homem e de seu lugar no universo, assim como novos métodos científicos que constituem a base de toda a ciência ocidental. O projeto básico do Renascimento consistia em resgatar o mundo clássico em seus próprios termos (o imitatio). Isto é, em vez de fazerem uma leitura cristã dos gregos – como fizeram Agostinho e Aquino –, os renascentistas estudaram profundamente filologia e arqueologia, visando a “renascer”, o que eles entendiam ser a glória perdida do mundo clássico. 
2 As Reformas Protestantes (século XVI), que pregaram a consciência individual como plenamente capaz de chegar à verdade religiosa e dividiram a sólida Igreja Feudal. Se, na Idade Média, a Igreja Católica impunha sua hegemonia sobre a Europa, agora o mundo aparecia, do ponto de vista religioso, como absolutamente fragmentado. 
3 O Estado Absolutista, que se impõe a um determinado território: se, na Idade Média, o mundo europeu estava fragmentado em feudos e pulverizado em relações feudo-vassá- licas, a Idade Moderna conhece a formação de Estados que unificam os impostos, as leis e o exército. Esse Estado coordenou as práticas econômicas conhecidas como mercantilismo. 
4 A Expansão Ultramarina, com a conquista da América e partes da África e Ásia pelos europeus. A Europa se impõe como continente hegemônico no mundo ocidental. Os recursos adquiridos no processo de colonização, além do mais, foram fundamentais para a formação do capitalismo. 
No bojo do Renascimento Cultural e Científico, a obra de Maquiavel representa uma nova visão do homem da ética e da política, rompendo com as concepções medievais. 
No século XVII, ocorre a chamada Querela (ou Disputa) entre os Antigos e Modernos: os filósofos passam não mais a resgatar o passado greco-romano, como fizeram os renascentistas, mas buscam superá-lo. É nesse sentido que o racionalista Descartes e o empirista Francis Bacon criam os métodos científicos modernos. 
Thomas Hobbes, por sua vez, rompe com a visão aristotélica de política: ele passa a pensar o homem não mais como um animal político, movido pelas virtudes, mas como um animal interesseiro, movido pelo medo.
Medieval X Renascimento
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NICOLAU MAQUIAVEL 
O autor de O Príncipe aborda o papel da ética e sua relação com a política. Origem Florença (1469-1527) 
CORRENTE FILOSÓFICA 
Humanismo Cívico Florentino 
PRINCIPAIS OBRAS 
O Príncipe; Os Comentários sobre a Primeira Década de Tito Lívio; A Arte da Guerra; Mandrágora 
Frase-síntese 
“Não se aparte do bem, mas, havendo necessidade, saiba valer-se do mal.” 
BIOGRAFIA 
Nascido no conturbado fim do Quattrocento (XV), o florentino Nicolau Maquiavel teve, assim como os outros renascentistas, uma formação humanista. Formado na Universidade de Florença, ele atuou como uma espécie de diplomata de sua cidade: foi a diversas cortes estabelecer tratados, alianças e relatórios, conhecendo o contexto de cada país e, como ótimo observador, enxergando defeitos e qualidades nas artes de governar.
Maquiavel
Preso e torturado sob a acusação de conspiração, Maquiavel viveu em reclusão, o que trouxe à mente do diplomata um agudo senso de realismo, e uma obsessão pela garantia da estabilidade dos Estados. 
Em reclusão, visando a retornar à administração do principado florentino, Maquiavel escreveu um livro a Lourenço de Médici intitulado O Príncipe. Assim, o principado de Médici concedeu o perdão a Maquiavel, dando a ele o título de historiador. Em 21 de junho de 1527, Maquiavel morre, doente.
 “Os meios serão sempre julgados honrosos e por todos louvados, porque o vulgo sempre se deixa levar pelas aparências e pelos resultados, e no mundo não existe senão o vulgo; os poucos não podem existir quando os muitos têm onde se apoiar.” 
Fins justificam os meios...
A FILOSOFIA DE MAQUIAVEL 
O termo “maquiavélico” sempre esteve associado à astúcia, falsidade e má-fé. Foi empregado, por exemplo, para caracterizar governos despóticos e políticos corruptos. Os dicionários apontam esse termo como “astuto”, “ardiloso”. 
De fato, o nome de Maquiavel foi Retrato de Nicolau Maquiavel, por Santi di Tito (Reprodução) FILOSOFIA PERÍODOS HISTÓRICOS - RENASCIMENTO 52 considerado uma ameaça às bases morais da vida política. Mas isso, de maneira alguma, expressa o pensamento desse humanista: Maquiavel nunca foi maquiavélico. Foi em meio a uma Itália fragmentada, permeada por guerras e jogos de poder, que Maquiavel escreveu sua mais famosa obra: O Príncipe. A questão central do livro são o papel da ética e sua relação com a política. 
Em O Príncipe, pela primeira vez na história do pensamento político, a ação política despiu-se de preceitos morais cristãos, ou, como diria Benedetto Croce, percebeu-se que “a política não se faz com água-benta”. Maquiavel mostrou existirem duas éticas distintas: uma ética cristã, útil para salvar a alma (ser bom sempre, nunca mentir, não usar máscaras), e uma ética política, útil para salvar o Estado (ser mau quando necessário, mentir quando a situação exigir, parecer bom e piedoso). 
Em Maquiavel, a ética política é utilitária, ou seja, são morais todos os atos úteis à comunidade, ao passo que são imorais os atos que tiverem em vista a satisfação de interesses egoístas, que entrem em conflito com os interesses da coletividade. Rompeu-se, aqui, com a ideia dominante de que o príncipe deve ser sempre bondoso (no sentido cristão da palavra). 
Haveria, portanto, uma ragione di stato (razão de estado). Isso não significa que Maquiavel era um defensor da maldade e da corrupção – sua filosofia tem uma profundidade muito maior que essa –, mas defende a ideia de que o príncipe deve saber “não ser bom”, existindo, portanto, “crueldades mal usadas ou bem usadas”. 
É nesse sentido que Maquiavel diz: “Se bem considerar tudo, encontrar-se-á alguma coisa que parecerá virtude, e segui-la seria a ruína, e alguma coisa que parecerá vício, e seguindo-a obtém a segurança e o bem-estar”. Maquiavel está mais interessado no Estado como ele é de fato, e suas possibilidades reais (o mundo como ele é), do que no que ele deveria ser – Maquiavel é realista e, profundamente renascentista, está interessado nas questões de sua época. 
Segundo Isaiah Berlin, ao admitir a pluralidade de éticas, Maquiavel foi um precursor do liberalismo. 
temido...
Maquiavel hoje 
O que exigir de um político? Podemos exigir que ele sempre diga a verdade, sempre fale o que pensa e nunca pense nas aparências? Ou, pelo contrário, se o político disser sempre a verdade, for pleno e íntegro, seria a ruína do Estado e ele nunca seria íntegro? A relação entre verdade e política é conflituosa e bastante atual – especialmente no período eleitoral –, e Maquiavel foi o primeiro a nos mostrar essa questão.
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FRANCIS BACON 
Um dos ícones do empirismo, Bacon defendeu o método experimental contra a ciência especulativa clássica Origem Londres (1561-1626)
CORRENTE FILOSÓFICA 
Empirismo 
PRINCIPAIS OBRAS
 Novum organum; The Advancement of Learning (ampliado posteriormente com o título De augmentis); New Atlantis 
Frase-síntese 
“Saber é poder.”  
BIOGRAFIA 
Nascido em Londres, em 1561, Francis Bacon foi um homem da política, atuando desde jovem como diplomata e chegando ao cargo de lorde-chanceler no governo de Jaime I, em 1618. No mesmo ano recebeu o título de barão de Verulam e, três anos mais tarde, o de visconde de St. Albans. 
Seu prestígio era tamanho que se especulou – sem provas concretas – que ele fosse o verdadeiro autor das obras de Shakespeare. Posteriormente, em 1621, Bacon foi afastado da política, acusado de corrupção. Proibido de exercer cargos públicos, ele dedicou-se mais intensamente à ciência – foi pioneiro ao traçar o primeiro esboço racional de uma metodologia científica. 
O filósofo morreu de maneira trágica, como mártir da ciência: buscando estudar o processo de congelamento de uma galinha durante o inverno, acabou morrendo devido ao frio. Francis Bacon (National Portrait Gallery/Reprodução) “A verdade surge mais facilmente do erro do que da confusão.” 
Bacon
A FILOSOFIA DE BACON
 Bacon é um dos ícones do empirismo e considerado, junto a Descartes, um dos fundadores da filosofia moderna graças a sua defesa do método experimental contra a ciência especulativa clássica. Em contrapartida ao racionalismo cartesiano, contudo, o empirismo representa uma tradição filosófica que, tomando como lema a frase aristotélica “nada está no intelecto que não tenha passado antes pelos sentidos”, acredita que todo conhecimento resultaria de percepções sensíveis, desenvolvendo-se a partir desses dados. 
O empirismo é uma forma de autonegação: deixe o objeto falar por si só, a partir disso a verdade é acessível. Bacon visava a uma reforma filosófica que garantisse o progresso das ciências contra a  escolástica.
 Assim, seu pensamento crítico tinha como objetivo libertar o homem de preconceitos, fantasias e superstições que impediriam a construção do verdadeiro conhecimento. Nesse contexto, encontramos sua teoria dos ídolos. 
Os ídolos seriam obstáculos, distorções ou ilusões que “bloqueiam a mente humana”, conduzindo o homem ao erro. 
►Haveria os ídolos da tribo, ou seja, os que resultam da natureza humana, a qual, imperfeita, distorce e corrompe as coisas devido aos limites naturais da própria razão – o homem não possui um lugar privilegiado no universo e, por isso, não há nada no universo que lhe permita conhecê-lo. 
►Já os ídolos da caverna resultam das características individuais, ou seja, a constituição física e mental de cada um, sua experiência de vida, sua educação e seu meio, os quais prejudicariam o processo de conhecimento da realidade. 
►Os ídolos do foro (ou do mercado) são resultado da linguagem, comunicação e do discurso, ou seja, as palavras poderiam perturbar o intelecto e arrastá-lo a diversas controvérsias. 
►Finalmente, os ídolos do teatro são aqueles resultantes das doutrinas filosóficas e cientí- ficas, as quais criam mundos fictícios e teatrais, que muitas vezes aceitamos (Bacon referia-se, principalmente, à escolástica). 
→Obviamente, seria impossível desfazer-se de todos os ídolos, mas, conhecendo sua natureza, poderíamos combatê-los. Tendo consciência dos ídolos que bloqueiam a mente humana, seria necessário ao homem despir-se de seus preconceitos, tornando-se uma “criança diante da natureza” para, assim, alcançar o verdadeiro saber. 
A partir de então, Bacon propôs um novo método científico. O método é a indução, a qual, baseada nas observações e na experiência, permite ao homem conhecer a regularidade, o funcionamento e as relações entre os fenômenos da natureza, formulando, dessa forma, as leis científicas. 
Essa ciência possibilitaria o controle total da natureza para, assim, beneficiar o homem, fazendo previsões e desenvolvendo instrumentos técnicos – extensões de nossos membros que ajudam a superar nossas limitações. 
Dessa maneira, o progresso do conhecimento significaria o progresso do homem, por isso sua famosa frase: “Saber é poder”. 
Bacon hoje 
O pensamento de Bacon foi fundamental para combater a superstição em sua época. 
Hoje, entretanto, a razão instrumental defendida por Bacon e sua glorificação da técnica são fortemente questionadas na filosofia contemporânea, em particular pela Escola de Frankfurt e por Heidegger. 
Será mesmo que saber é poder? Será correta a noção de que o progresso das ciências traz necessariamente o progresso dos povos? Ou melhor, seria correta a ideia de progresso? No século XIX, por exemplo, acreditava-se que o desenvolvimento das ciências naturais (física e química) nos levaria à paz e à perfeição. 
As guerras mundiais, as ditaduras e os incontáveis massacres dos séculos XX e XXI solaparam essa ideia: a razão, com toda sua importância, não salvou a humanidade. Nesse sentido, qual o papel da sensibilidade na história do homem?
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RENÉ DESCARTES 
O criador do racionalismo cartesiano sustenta que o homem não pode alcançar a verdade pura através de seus sentidos 
Origem
 Próximo a Tours (França) (1596-1650)
 CORRENTE FILOSÓFICA 
Racionalismo 
PRINCIPAIS OBRAS 
O Discurso do Método; Geometria e Meditações; Meditações sobre Filosofia Primeira Princípios da Filosofia; O Homem Frase-síntese “Penso, logo existo.”
Descartes
BIOGRAFIA 
Nascido em La Haye, na França, em 31 de março de 1596, René Descartes é considerado um dos pais da filosofia moderna. Tendo estudado com os jesuítas na infância, graduouse em direito em 1616, pela Universidade de Poitiers. 
Depois de uma breve passagem pela vida militar, diz a tradição que, após um sonho que teve numa viagem à Alemanha, passou a dedicar-se ao estudo de matemática e filosofia. Conhecido em sua época, suas obras foram, por uns, louvadas; por outros, condenadas como heréticas.
cogito...
 Depois de sua morte, em 1650, na Suécia, onde trabalhava para a rainha Cristina, seus livros foram proibidos pela Igreja Católica.
 “Mas imediatamente que eu observava isso, que os pensamentos de sonho se confundem com a realidade, ainda assim eu desejava pensar que tudo era falso, era absolutamente necessário que eu, quem pensa, seja algo; e enquanto eu observava que isso é verdadeiro, eu penso, logo existo, era tão certo e tão evidente que eu aceitei este como primeiro princípio de filosofia, que eu estava refletindo.” 
A FILOSOFIA DE DESCARTES 
René Descartes é responsável pelo desenvolvimento do racionalismo cartesiano, segundo o qual o homem não pode alcançar a verdade pura através de seus sentidos: as verdades residem nas abstrações e em nossa consciência, na qual habitam as ideias inatas. 
Diante do forte ceticismo na época do Renascimento, muitas pessoas acreditavam que os métodos científicos eram falhos, incompletos e sujeitos ao erro, de forma que seria impossível para o homem conhecer o mundo real e fazer ciência de maneira verdadeira. 
A missão de Descartes era justamente legitimar a ciência, demonstrando que o homem poderia conhecer o mundo real. Para encontrar uma certeza inquestionável, Descartes duvidou de tudo. 
A dúvida cartesiana é justificada por três argumentos. 
►Primeiramente, a ilusão dos sentidos, ou seja, não poderíamos confiar nos nossos sentidos, os quais são limitados e enganosos. 
►Em segundo lugar, não sabemos distinguir o mundo externo daquilo que é produto de nossa mente (argumento dos sonhos). 
►Em terceiro lugar, há o gênio maligno: quem diz que não há um deus ou um demônio malévolo poderoso e astuto que dedicasse todas suas energias para enganar os homens? 
Plano Cartesiano
Nesse momento, portanto, criou-se um impasse: como Descartes poderia encontrar certezas irrefutáveis se, ao mesmo tempo, acreditava que deveria duvidar sistematicamente de tudo que se apresentasse para ele? Se, por um lado, Descartes acreditava que o ato de duvidar punha em dúvida até nossos sentidos, por outro, é impossível duvidar do pensamento: afinal, duvidar do pensamento é pensar. 
Mesmo a possibilidade de um deus enganador pressupõe a existência de um ser pensante que esteja nas garras desse gênio. Dessa forma, nosso pensamento e nossa existência seriam um ponto de partida inquestionável, uma certeza a partir da qual Descartes poderia edificar seu método filosófico. Nasceu então a famosa máxima cartesiana, o argumento do cogito: “Penso, logo existo” (Ego cogito ergo sum). 
Porém, o problema de Descartes ainda não estaria resolvido: se a única certeza do homem é o “eu”, ou seja, seu pensamento e sua existência, como Descartes iria fazer a ponte que ligasse a certeza que residia no indivíduo à incerteza do mundo externo? Como não cair no solipsismo? 
Solipsismo é a doutrina segundo a qual só existem, efetivamente, o eu e suas sensações, sendo os outros entes (seres humanos e objetos) partícipes da única mente pensante, meras impressões sem existência própria. Descartes, então, cria uma ponte entre o pensamento subjetivo e a realidade objetiva. Dessa forma, o filósofo afirmou que o pensamento, sua única certeza, seria composto por ideias. Uma ideia seria válida na medida em que fosse clara e distinta o suficiente para diferenciá-la das outras. 
Haveria, para ele, três tipos de ideias: as ideias inatas (naturais, que se encontram no indivíduo desde o nascimento, de modo que não adquirimos pela nossa experiência), as ideias adventícias (ou seja, empíricas, que formarmos ao longo de nossa vida, a partir da experiência, estando sujeitas à dúvida) e as ideias factícias ou da imaginação (que formamos na nossa mente a partir das outras ideias).
É a partir das ideias inatas que Descartes fundamentou sua prova da existência de Deus. A ideia de Deus, presente em nossa mente, é a ideia de uma entidade perfeita. O homem por si só seria incapaz de chegar à clara e distinta ideia de perfeição, já que não haveria nenhuma correspondência desse ideal no mundo concreto. 
Assim, a ideia de perfeição seria inata, colocada no homem por Deus, a grande marca do criador em sua obra. Se Deus existe, fica provado que o mundo por ele criado também existe. Assim, note que Descartes provou que o “eu” existe e, por meio do raciocínio dedutivo, provou também, a partir das premissas anteriores, que Deus e o mundo existem. Eis a ponte entre o pensamento subjetivo e a realidade objetiva, isto é, a prova de que “o eu e o mundo” existem. 
Descartes hoje 
Descartes mostrou, a partir do pensamento dedutivo, a existência do homem e de Deus. Desde então, o pensamento cartesiano foi associado a uma visão extremamente racionalista do homem e do mundo. É cartesiana, por exemplo, a visão de que o homem e o universo seriam máquinas: para Descartes, tal qual um relógio, o ser humano poderia ser compreendido (e, eventualmente, “consertado”) a partir das partes que o compõe. 
O filme Ponto de Mutação e o livro homônimo de Fritjof Capra colocam em questão essa visão cartesiana de mundo: o homem e o universo são perfeitamente racionalizáveis, isto é, podem ser entendidos a partir dos elementos físico-químicos que os compõem? 
A visão de Capra, conhecida como holística, em contraposição ao pensamento cartesiano, crê que o homem deve ser compreendido em sua totalidade – todas as partes de seu corpo e mente estariam absolutamente integradas. Quando a medicina holística hoje, por exemplo, acredita que um problema em determinado órgão pode estar relacionado a uma questão de ordem emocional, são esses paradigmas filosóficos que estão em questão. Eis uma questão fundamental para o pensamento contemporâneo.
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THOMAS HOBBES
 Para o filósofo, o homem não é um animal político ou social, como dizia Aristóteles, mas um lobo egoísta e interesseiro, que sempre quer saciar seu apetite Origem Westport (Inglaterra) (1588-1679) 
CORRENTE FILOSÓFICA
 Empirismo 
PRINCIPAIS OBRAS
 Leviatã; Do Cidadão; Do Corpo; Do Homem; Os Elementos da Lei 
Frase-síntese
 “O homem é o lobo do homem.” 
lobo...
BIOGRAFIA
 Thomas Hobbes nasceu na aldeia de Westport, na Inglaterra, em 1588. Em 1608, já formado em arte, passou a trabalhar como preceptor na poderosa família Cavendish, um importante lorde inglês, o que lhe permitiu fazer viagens de aprimoramento cultural. Visitou a França e a Itália em 1610 e estudou literatura e filosofia. Entre 1621 e 1626, trabalhou como secretário de Francis Bacon, para quem traduziu algumas obras.
Hobbes vivenciou grande parte do longo processo da Revolução Inglesa (1640-1689), quando o povo inglês lutou contra o absolutismo da dinastia Stuart. Fervoroso defensor da Monarquia, escreveu seu primeiro tratado sobre o regime, Elementos da Lei Natural, em 1640, e foi obrigado a se refugiar em Paris. Retornou à Inglaterra pouco tempo depois, mas voltou a se refugiar na França, por causa dos ideais absolutistas expostos em Leviatã, em 1651. Um ano depois, voltou à Inglaterra, então governada por Oliver Cromwell. 
Morreu em Hardwick, em 1679. “As paixões que, mais do que quaisquer outras, causam diferenças de espírito são principalmente um maior ou menor desejo de poder, de riquezas, de conhecimento e de honra, as quais podem todas reduzir-se à primeira, isto é, ao desejo de poder. Pois as riquezas, o conhecimento e a honra não são senão formas diversas de poder. Assim, considero como principal inclinação de toda a humanidade um perpétuo e incessante afã de poder, que cessa apenas com a morte.” 
leviata
A FILOSOFIA DE HOBBES
 Em sua obra Leviatã (Leviatã é um bíblico monstro gigantesco que representa o Estado), Hobbes inaugurou um novo modo de pensar a política, refletindo não apenas sobre os paradigmas já existentes, mas questionando-se sobre a origem do Estado, sua função etc. Se, em Maquiavel, o problema era a conservação do poder, em Hobbes, o problema é a conservação do homem. A obra é escrita no bojo da Revolução Puritana Inglesa e sua guerra civil: o texto é uma defesa do absolutismo, justamente, quando ele vivia uma profunda decadência na Inglaterra. 
O ponto de partida de Hobbes é a construção de um hipotético estado de natureza. O estado de natureza é um estado de violência, de guerra: Bellum omnium contra omnes (a guerra de todos contra todos). Assim, para Hobbes, o homem é, desde a mais tenra infância, egoísta, parcial, competitivo, orgulhoso, vingativo, vaidoso e ambicioso: homo homini lupus (o homem é o lobo do homem). O homem não é um animal político ou social, como dizia Aristóteles, mas um lobo egoísta e interesseiro, que sempre quer saciar seu apetite. O desejo de se preservar é a fonte mais abundante dessa guerra, que nos instiga a ver o próximo como um inimigo. 
Para alcançar nosso insaciável desejo de poder, estaríamos sempre matando, subjugando e repelindo o próximo. Afinal, o homem só encontra a felicidade por comparação com os outros homens, ou seja, sua felicidade depende da miséria do próximo: “Todo o prazer intelectual e toda a felicidade se baseiam no fato de ter uma pessoa com quem se comparar e em relação a quem se sentir superior”. 
Portanto, a vida anterior ao Estado e à sociedade – no hipotético estado de natureza – seria brutal, violenta, miserável, infeliz e solitária, a guerra de todos contra todos, marcada pelo mais intenso sentimento do homem: o medo da morte. Dessa forma, qual seria a maneira de conter essa natureza humana e solucionar o problema do medo e da guerra de todos contra todos? Por meio de um contrato, de um pacto, as pessoas atribuem ao Estado poderes absolutos. 
O ser humano, calculista e que teme  a morte, aceita sacrificar sua liberdade em nome de sua segurança. 
O Estado e a sociedade teriam nascido juntos, representando o fim do estado de natureza, quando o homem renunciou todos os direitos e as liberdades individuais para um soberano, que, em troca, governando com poderes absolutos, conteria o lobo do homem, ou seja, protegeria o homem dos seus semelhantes, evitando o medo e a guerra entre os homens. O medo da morte, característica humana, é utilizado aqui em favor da paz. 
melhor...
O Estado absoluto é a melhor maneira de garantir a liberdade individual. Enquanto os republicanos diziam que o homem só é livre se viver num Estado livre, Hobbes lembra que, ao abdicarmos de nossa liberdade de fazer leis ou escolher representantes periodicamente, ganhamos inúmeras outras liberdades, como a tranquilidade, a busca por enriquecimento sem incômodos, o exercício dos nossos talentos, o aprimoramento individual, a busca da felicidade, entre outros. 
Perceba, entretanto, que Hobbes legitima o Estado a partir da função que ele tem de proteger seus súditos; por isso, a maioria dos defensores do absolutismo, na época de Hobbes, não o apoiou, pois, para eles, o soberano legitimava-se pelas Escrituras ou pela Tradição. 
Hobbes hoje
 Qual a relação entre medo e política? Se Hobbes pensa o surgimento do poder a partir do medo, é preciso pensar, na atualidade, a importância do medo: a proliferação de condomínios fechados, seguros de vida caríssimos, dezenas de mecanismos de proteção de carro e, pior, a sedução, que leva a discursos demagógicos, com líderes políticos que, utilizando um discurso do medo, afirmam ser a solução para a pátria, que, segundo eles, está ameaçada. O medo é, sem dúvida, um importante componente da vida social.

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